28.1.19

fascismo e nazismo


Nem nas suas origens, nem na constituição do Estado, ou no modelo de Estado, estes dois sistemas coincidiram, não se podendo falar dos dois sem os diferenciar. Em comum eles partilham uma origem socialista, uma leitura inicial do momento em que viviam sob a perspetiva da luta de classes. Isso, porém, também não surgiu da mesma maneira em cada país.

Mussolini esteve profundamente empenhado no movimento socialista, Hitler não. Mussolini articulou interesses de maneira a tomar o poder e disse que tinha feito uma marcha sobre Roma, ao que parece um tanto mítica, mas conduziu-se, de qualquer modo, como um Chefe (e a mitificação do chefe não é um exclusivo da direita nem da esquerda - veja-se a idolatria de Lenin, de Stalin e de outros santos). O Chefe, porém, encarnado em Mussolini (com maiúscula, claro!) seguia uma estratégia simultaneamente política e militar (ou pelo menos guerrilheira, ou paramilitar). Hitler tomou de assalto algumas cervejarias e discursava acendendo rancores e frustrações trazidos com a derrota alemã na I Grande Guerra, onde ele próprio não desempenhou nenhum papel de relevo. Um era ativo, ou proativo, o outro reativo. Um trabalhava um projeto de cuja conceção participava; o outro aproveitava ressentimentos existentes e difusos para subir ao poder. O primeiro, apesar de tudo, foi menos destrutivo que o segundo e foi subalternizado por Hitler. 

O nazismo baseou-se na fusão entre o conceito de luta de classes e o conceito de luta de nações e, ainda, o de luta de etnias - se pudermos chamar os alemães de etnia, tanto quanto os judeus o foram na Alemanha (cientificamente seria difícil de justificar), ou os ciganos. A versão era, em resumo, esta: a nação alemã, maioritariamente constituída e preservada pelo operariado pobre, estava humilhada, empobrecida no seu próprio país (excetuando alguns membros da elite corrompida com o dinheiro da burguesia judaica); pelo contrário, os semitas (reduzidos a 'os judeus'), em triunfo sobre os escombros da guerra, detinham todo o poder económico e exploravam a classe operária, ou seja, os alemães, abafando inclusivamente a sua cultura, afirmativa, gloriosa, alegre, dando como alternativa produções artísticas doentias, melancólicas e decadentes. Acabar com a burguesia e prosseguir um projeto socialista implicava acabar com os judeus, exterminá-los completamente na Alemanha, que só então seria uma nação livre de exploradores. E, para que a limpeza fosse completa, da antiga elite alemã ficariam só os que fossem capazes de abandonar definitivamente qualquer laço ou lassidão para com os judeus. A burguesia, por sua vez, como também a elite militar, haviam de subjugar-se ao projeto nacional-socialista para se manterem no ativo. O partido controlaria e determinaria o mínimo passo a dar. E deu no que deu: uma derrota estrondosa, uma falta de estratégia gritante e o massacre inútil e massificado de milhares de inocentes em nome da 'raça' ...que terá derrotado os 'verdadeiros alemães' outra vez.

Isto é brutal, mas veio repetindo-se em várias partes do mundo até hoje, embora sem câmaras de gás e mudando os nomes de alemães e judeus. O extermínio dos tutsis no Ruanda legitimava-se, mutatis mutandis, por sofismas e conotações deste género.

O fascismo, neste quadro, diferenciava-se do nazismo. O fascismo entendeu que a luta de classes dividia a nação e, portanto, sem deixar de fazer uma leitura classista da sociedade italiana, tentou construir um Estado corporativo onde estivessem representadas as várias classes, agora vistas como 'forças vivas' que, juntas, formariam o facho da grande Itália e a reconduziriam à glória do Império Romano. Uma autêntica paranóia, sem dúvida - mas que, ainda assim, permitiu a sobrevivência, durante alguns anos, de uma república anárquica de artistas e poetas encravada numa das suas fronteiras.

É certo que, num caso quanto no outro (e à semelhança do que na prática sucedeu nos países comunistas), havia um partido que neutralizava ou abolia o multipartidarismo e tomava sozinho conta da Nação, fosse qual fosse o modelo de Estado, que ficaria sempre subjugado ao Partido. Isso desvirtuava a diferença e facilitou o domínio dos alemães, hipermilitarizados, precisos e autocensurados, sobre os italianos, intuitivos, imprecisos e indisciplinados. Esse domínio, como sabemos, permitiu que Mussolini tivesse ainda um último fôlego, servindo apenas de capacho para as botas alemães que iam lá buscar judeus. O nacionalismo italiano tinha sido esmagado pelo nacional-socialismo alemão e com a ajuda do próprio Duce, que não se matou como Hitler, morreu pendurado de cabeça para baixo pelos restantes italianos. 

Uma segunda diferença deriva da génese da ideia que veio presidir ao nazismo. Ela nasceu dentro do que se chamava 'o socialismo alemão', quando Hitler apenas havia completado 4 ou 5 anos, ou mesmo antes. No III Congresso dos 'socialistas alemães' - assim referido num jornal de Benguela (Angola) em 1892, ou 1893 - eles teriam decidido incluir no cardápio os judeus à sobremesa, ou seja, eles fizeram a tal confusão do conceito de burguesia com a etnia judaica e do conceito de proletariado com a nação alemã e a etnia ariana. Hitler usou, portanto, um cardápio já criado. Mussolini, pelo contrário, participou da criação da ideia que lhe dirigiu o poder e não punha a tónica na exterminação de uma etnia, mas na organização corporativa do Estado, devidamente dirigido pelo seu Duce, isto é, Comandante, e com a burguesia subordinada aos interesses considerados nacionais, quer pela Assembleia da Corporação e do Fáscio, quer pelo Grande Conselho Fascista, que incluía o Presidente da Academia. 

São diferenças significativas e que nos impedem de confundir os dois tipos de sistema político-partidário, como também nos deviam impedir de chamar, indiferentemente, nazi ou fascista à mesma pessoa, só porque ela não é nem democrata nem comunista. Mas também não podemos limitar a génese dos dois sistemas à sua origem socialista. Isso é redutor e inexato, embora seja parcialmente verdadeiro (nesta parte que venho de mencionar). 

Dito o que, declaro que não sou nem fascista, nem nazi, nem comunista e que tenho sérias dúvidas sobre a democracia tal como ela se nos apresenta hoje: partida, partidária e tendencialmente dirigista. 





18.1.19

O assassinato e o pacifismo - Rosa Luxemburg

Le Monde - Idées

"Le 13 juin 1919, une foule considérable accompagne dans les rues de Berlin la dépouille d’une femme repêchée le 31 mai et identifiée comme celle de Rosa Luxemburg.Le recueillement populaire se mue en manifestation de masse. C’est la seconde inhumation de cette militante socialiste et théoricienne marxiste puisqu’un cercueil vide à son nom avait été porté en terre le 25 janvier, avec les corps des 32 autres victimes de la répression du soulèvement spartakiste, comme elle assassinées le 15 janvier. 

Rosa Luxemburg fut victime des corps francs chargés, par le ministre SPD de la défense Gustav Noske, d’écraser l’insurrection que le député socialiste gagné au communisme Karl Liebknecht (1871-1919) avait déclenchée. Rosa est une « martyre » du communisme naissant, un peu malgré elle puisqu’elle juge la révolte prématurée : elle la soutient par loyauté envers son ami, titrant amèrement son dernier article publié le 14 janvier dans Die Rote Fahne (Le Drapeau rouge), le quotidien spartakiste, « L’Ordre règne à Berlin ». Martyre donc mais martyre encombrante. 

Pacifiste intransigeante, elle se défie de l’autoritarisme léniniste, condamne la terreur bolchevique,  et si son nom est donné dès 1921 à une ville géorgienne, Staline dénonce sa critique de la révolution d’Octobre et l’exclut de la galerie des phares du marxismereconnus par l’Internationale communiste."

https://www.custojusto.pt/evora/livros/rosa-luxemburg-introd-economia-politica-ii-26820127